16.1.07
Anuncia o IEFP, a partir do Portal do Cidadao, que cerca de 1.300 desempregados viram aprovados em 2006 os seus projectos de financiamento para criacao de emprego proprio utilizando os seus subsidios de desemprego. Efectivamente, ja desde 1985, quando foi introduzido o subsidio de desemprego em Portugal, que esta previsto que um recem-desempregado receba pelo menos parte dos subsidios a que tem direito caso apresente um "bom" projecto de empreendedorismo junto do Ministerio do Emprego.
Talvez seja uma ideia interessante, ate porque a pouca evidencia disponivel em Portugal (e.g. o trabalho de Luis Cabral e Jose Mata sobre a distribuicao do tamanho das empresas portuguesas) sugere que as dificuldades de financiamento sao uma restricao importante 'a constituicao de novas empresas no pais. (Alem disso, a concentracao no sector bancario nao ajuda obviamente.) Infelizmente, desconhece-se qualquer estudo que procure avaliar o sucesso dos varios milhares de empresas criadas desde 1985 atraves de antecipacoes dos subsidios de desemprego. Ate essa evidencia estar disponivel, so se podera especular se Portugal fica a ganhar ou a perder com este esquema de apoio ao empreendedorismo (e, logo, se o esquema devia ser alargado ou restringido).
11.1.07
Na mesma semana em que em Inglaterra sao anunciados os resultados das escolas secundarias, em Portugal decide-se que as provas globais do 9.o ano deixam de ser obrigatorias. Se a ignorancia em relacao ao que se aprende nas escolas ja era grande, agora sera ainda maior. O que e' particularmente preocupante numa altura em que sao introduzidas varias alteracoes no funcionamento das escolas (incluindo o novo Estatuto da Carreira Docente, promulgado pelo Presidente da Republica esta semana), alteracoes essas de impacto dificil de prever. Pior que nao saber e' nao saber que nao se sabe.
Do Publico de hoje: "As provas globais, realizadas por cada escola aos seus alunos do 9.º ano e a todas as disciplinas com excepção da Língua Portuguesa e da Matemática, vão deixar de ser obrigatórias e, como tal, poderão já não contar para nota este ano lectivo. O despacho que altera as regras de avaliação no ensino básico foi publicado ontem no Diário da República e determina que a decisão sobre a realização de provas globais ou de um trabalho final nas disciplinas não sujeitas a exame nacional compete a cada uma das escolas. (...) As provas globais no final do ensino básico contavam 25 por cento para o cálculo da nota final de cada disciplina."
9.1.07
Organizada por um think-tank holandes, a "Cicero Foundation" (para quando think-tanks em Portugal?), decorre em Paris a 15 e 16 de Fevereiro uma conferencia sobre "Labour Market Reform in the European Union: Learning from Best Practices".
Uma das apresentacoes, pela confederacao de empregadores da Dinamarca, incide sobre "Flexicurity - can it be copied?". De acordo com este paper, pode ser dificil trazer a flexicurity para o Sul da Europa...
8.1.07
Entre os participantes na conferencia dos 30 anos do MIT em Portugal incluia-se Paul Krugman, possivelmente o economista que com mais clareza consegue falar de economia a publicos alargados. As suas cronicas semanais no New York Times (varias delas sobre o o aumento da desigualdade no mercado de trabalho dos EUA) podem ler-se (sem assinatura) em http://economistsview.typepad.com/economistsview/2007/01/paul_krugman_re.html
(Pedro) Portugal: salarios baixos ou salarios altos?
O ultimo boletim economico do Banco de Portugal publica um artigo importante sobre o mercado de trabalho portugues: "O Esgotamento do Modelo Económico Baseado em Baixos Salários", de Pedro Portugal ". O artigo e’ critico do conceito de “modelo economico de salarios baixos”, entre outras razoes porque, quando considerando indices de produtividade, nao e’ nada claro que os salarios portugueses sejam afinal assim tao baixos. Uma das razoes para a actual anemia da economia portuguesa (e os problemas de defice publico e desequilibrio externo) ate sera precisamente a falta de competividade internacional que resulta de salarios demasiado proximos ou mesmo superiores ‘a produtividade.
Por outro lado, o artigo infelizmente nao reconhece que e’ tambem inequivoco que, quando comparados com os salarios da Europa dos 15 (e esquecendo, por um momento, a dimensao da produtividade), os salarios portugueses sao obviamente mais baixos. Alem disso, e’ sobejamente conhecido que o padrao de exportacoes da economia portuguesa, pelo menos ate ‘a decada de 1990, estava baseado em sectores cuja competitividade resultava em grande medida de salarios baixos. Em outras palavras, Portugal era uma micro-China, que compensava salarios proporcionalmente mais elevados que os asiaticos com custos de transporte mais baixos, complementados com pautas aduaneiras.
Em todo o caso, mesmo fazendo esta critica alguma injusta a este "modelo", o artigo descreve tambem uma serie de caracteristicas do mercado de trabalho que ajudam a explicar a flagrante e sustentada incapacidade de aumento da produtividade na economia portuguesa com as dificuldades de ajustamento do mercado de trabalho:
-a enorme rigidez nominal dos salarios (que se traduz em rigidez real no contexto actual de baixa inflacao);
-os elevados salarios da funcao publica;
-o comportamento pro-ciclico dos salarios.
Por outro lado, continuam a existir alguns mecanismos que podem facilitar o ajustamento dos salarios:
-as almofadas salariais entre os salarios minimos determinados pelas convencoes colectivas e os salarios praticados pelas empresas;
-a partilha de "rendas economicas" entre patroes e empregados;
-as concessoes salariais feitas pelos empregados em empresas em risco de falencia.
O mercado de trabalho portugues tambem foi tema de debate numa conferencia recente, a comemorar os 30 anos da missao economica do MIT a Portugal, organizada pela Fundacoes Luso-Americana pelo Desenvolvimento, entre outras entidades. Uma sugestao importante para lidar com o problema de competitividade portugues, lancada por Olivier Blanchard, entre outros, foi aumentar o horario de trabalho. Dadas as dificuldades de toda a ordem de se reduzir salarios para se repor a competitividade perdida, aumentar o numero de horas trabalhadas podera ser uma abordagem mais realista. (O caso da Volkswagen parece ser um exemplo de sucesso.)
A conferencia discutiu ainda uma serie de sugestoes para reforma do mercado de trabalho portugues lancadas por Pedro Portugal:
-divulgacao obrigatoria dos filiados em cada sindicato e associacao patronal;
-nao extensao das convencoes colectivas de trabalho;
-diminuicao do custo administrativo dos despedimentos individuais e colectivos, mesmo que com aumento do valor das indemnizacoes;
-aumento dos impostos de seguranca social para empresas com niveis de rotatividade da forca de trabalho mais elevados;
-reducao do periodo maximo de concessao dos subsidios de desemprego.
4.1.07
A ligação entre mais recursos e melhores resultados no contexto dos sistemas educativos tem merecido grande atenção por parte dos economistas (e.g. o debate intenso entre Alan Kruger, Princeton, e Eric Hanushek, Stanford). De uma maneira algo tautológica, o debate pode ser resumido a dizer que recursos levam a melhores resultados, mas só se os recursos forem bem empregues. O problema, claro está, é que nem sempre é óbvio quais são os métodos de empregar "bem" os recursos...
Para ter a certeza, é preciso ir além de análises teóricas e examinar dados empíricos com rigor e metodologias credíveis. É uma abordagem ainda com pouca expressão em Portugal mas já consagrada há muito no mundo anglo-saxónico. Um exemplo é um trabalho recente que desenvolvi com Ian Walker e que está disponível aqui. O objectivo foi estudar o impacto de diferentes aspectos das aulas práticas (o tamanho das turmas, a assiduidade dos alunos, a interacção entre os colegas, e o impacto dos assistentes) em termos dos resultados de alunos de cursos superiores numa universidade inglesa (no quadro de uma hipotética "função de produção"). Além dos resultados (que, resumidamente, sugerem que as aulas práticas, no modelo adoptado naquela universidade, têm um efeito relativamente modesto na "performance" dos alunos), o trabalho também tem interesse pela metodologia, que pode ser aplicada em qualquer universidade, incluindo as portuguesas...
3.1.07
O Ministério da Ciência e Ensino Superior anunciou ontem o congelamento do montante das propinas máximas para os próximos dois anos. É uma decisão que destoa do pendor aparentemente reformista do actual governo, nomeadamente no sentido de reduzir "privilégios" de "minorias" (e também vai contra o sugerido num recente relatório da OCDE sobre Portugal). Estando actualmente as propinas em €900, elas corresponderão a cerca de um sexto do custo médio anual de um aluno numa universidade pública, sendo o restante pago pelos contribuintes - o que poderia com alguma facilidade ser considerado outro "privilégio" de outra "minoria".
É óbvio que, em termos de análise económica, faz sentido que parte do custo da educação não seja cobrada a quem recebe esse serviço, uma vez que há externalidades positivas associadas à educação - o seu benefício não recai exclusivamente em quem frequenta o ensino superior público (um estudo empírico para Portugal encontra-se aqui). Além disso, o baixo nível de frequência universitária da população portuguesa torna ainda mais legítimo o deslocamento dos custos do estudante para o contribuinte (quanto menos universitários, maior é o benefício social extra de mais licenciados).
Por outro lado, não é claro que os termos actuais de divisão dos custos (um sexto/cinco sextos) seja o mais apropriado em termos de eficiência e equidade. Quanto à equidade, causa sempre desconforto pensar que os impostos de pessoas com a antiga quarta-classe (ainda a maioria dos trabalhadores em Portugal) são utilizados para pagar licenciaturas, sobretudo quando estas últimas abrem em muitos casos as portas a empregos bem remunerados. Além disso, a acreditar na percepção generalizada que as universidade privadas são frequentadas, em média, por estudantes de famílias menos abastadas, é importante ter em conta que as propinas no sector privado são cerca do triplo do valor cobrado no sector público.
Quanto à eficiência do actual nível de subsidiação, o problema coloca-se não só em termos do excesso de "consumo" de educação (que poderá ter como evidencia os níveis elevados de reprovação e não conclusão de licenciaturas), mas também pelas restrições colocadas ao investimento na qualidade do sector público. Por exemplo, em Inglaterra, o custo médio de um curso superior (£10.000) é cerca do triplo do valor em Portugal, o que sugere que há um enorme potencial a cumprir em termos da melhoria da qualidade do ensino superior. Já todos sabemos que "não há almoços grátis" - mas continua-se a querer não pagar a conta ou só comer migalhas.
Uma alternativa ao actual modelo de financiamento que merece ser considerada com atenção são as chamadas "propinas variáveis com o rendimento" ("income-contingent fees"), como os modelos adoptados ou em adopção em vários países, incluindo Inglaterra. Em vez de pagar as propinas enquanto estuda, os estudantes só começam a reembolsar o custo das suas licenciaturas a partir do momento em que estejam empregados e a auferir rendimentos suficientemente elevados. Diferindo o pagamento para a fase do ciclo de vida em que a pessoa está empregada, o Estado pode passar a cobrar mais pelo serviço que presta, sem criar obstáculos ao acesso ao ensino superior associados a propinas elevadas como inclusivé passando a dispor de mais recursos para proporcionar bolsas de estudo. Ao mesmo tempo, com mais recursos, pode finalmente passar a ser possível colocar Portugal no mapa cada vez mais globalizado (com os seus desafios e potencialidades) do ensino superior.
PS-O anúncio do MCES de ontem também sugere que os resultados das diferentes universidades em termos do percurso no mercado de trabalho dos seus ex-alunos vão receber mais atenção e, eventualmente, divulgação pública. É uma iniciativa que, quanto a mim, merece aplauso: quanto mais informação houver sobre um sector infelizmente ainda bastante opaco, melhor. Mas, mais uma vez, informação deste tipo terá que ser interpretada com cuidado: uma vez que os alunos seleccionam-se e são seleccionados para diferentes universidades, as diferenças que se venham a encontrar entre as universidades não irão reflectir unicamente as diferenças de "qualidade" das mesmas.