3.1.07
Propinas universitárias congeladas
O Ministério da Ciência e Ensino Superior anunciou ontem o congelamento do montante das propinas máximas para os próximos dois anos. É uma decisão que destoa do pendor aparentemente reformista do actual governo, nomeadamente no sentido de reduzir "privilégios" de "minorias" (e também vai contra o sugerido num recente relatório da OCDE sobre Portugal). Estando actualmente as propinas em €900, elas corresponderão a cerca de um sexto do custo médio anual de um aluno numa universidade pública, sendo o restante pago pelos contribuintes - o que poderia com alguma facilidade ser considerado outro "privilégio" de outra "minoria".
É óbvio que, em termos de análise económica, faz sentido que parte do custo da educação não seja cobrada a quem recebe esse serviço, uma vez que há externalidades positivas associadas à educação - o seu benefício não recai exclusivamente em quem frequenta o ensino superior público (um estudo empírico para Portugal encontra-se aqui). Além disso, o baixo nível de frequência universitária da população portuguesa torna ainda mais legítimo o deslocamento dos custos do estudante para o contribuinte (quanto menos universitários, maior é o benefício social extra de mais licenciados).
Por outro lado, não é claro que os termos actuais de divisão dos custos (um sexto/cinco sextos) seja o mais apropriado em termos de eficiência e equidade. Quanto à equidade, causa sempre desconforto pensar que os impostos de pessoas com a antiga quarta-classe (ainda a maioria dos trabalhadores em Portugal) são utilizados para pagar licenciaturas, sobretudo quando estas últimas abrem em muitos casos as portas a empregos bem remunerados. Além disso, a acreditar na percepção generalizada que as universidade privadas são frequentadas, em média, por estudantes de famílias menos abastadas, é importante ter em conta que as propinas no sector privado são cerca do triplo do valor cobrado no sector público.
Quanto à eficiência do actual nível de subsidiação, o problema coloca-se não só em termos do excesso de "consumo" de educação (que poderá ter como evidencia os níveis elevados de reprovação e não conclusão de licenciaturas), mas também pelas restrições colocadas ao investimento na qualidade do sector público. Por exemplo, em Inglaterra, o custo médio de um curso superior (£10.000) é cerca do triplo do valor em Portugal, o que sugere que há um enorme potencial a cumprir em termos da melhoria da qualidade do ensino superior. Já todos sabemos que "não há almoços grátis" - mas continua-se a querer não pagar a conta ou só comer migalhas.
Uma alternativa ao actual modelo de financiamento que merece ser considerada com atenção são as chamadas "propinas variáveis com o rendimento" ("income-contingent fees"), como os modelos adoptados ou em adopção em vários países, incluindo Inglaterra. Em vez de pagar as propinas enquanto estuda, os estudantes só começam a reembolsar o custo das suas licenciaturas a partir do momento em que estejam empregados e a auferir rendimentos suficientemente elevados. Diferindo o pagamento para a fase do ciclo de vida em que a pessoa está empregada, o Estado pode passar a cobrar mais pelo serviço que presta, sem criar obstáculos ao acesso ao ensino superior associados a propinas elevadas como inclusivé passando a dispor de mais recursos para proporcionar bolsas de estudo. Ao mesmo tempo, com mais recursos, pode finalmente passar a ser possível colocar Portugal no mapa cada vez mais globalizado (com os seus desafios e potencialidades) do ensino superior.
PS-O anúncio do MCES de ontem também sugere que os resultados das diferentes universidades em termos do percurso no mercado de trabalho dos seus ex-alunos vão receber mais atenção e, eventualmente, divulgação pública. É uma iniciativa que, quanto a mim, merece aplauso: quanto mais informação houver sobre um sector infelizmente ainda bastante opaco, melhor. Mas, mais uma vez, informação deste tipo terá que ser interpretada com cuidado: uma vez que os alunos seleccionam-se e são seleccionados para diferentes universidades, as diferenças que se venham a encontrar entre as universidades não irão reflectir unicamente as diferenças de "qualidade" das mesmas.
O Ministério da Ciência e Ensino Superior anunciou ontem o congelamento do montante das propinas máximas para os próximos dois anos. É uma decisão que destoa do pendor aparentemente reformista do actual governo, nomeadamente no sentido de reduzir "privilégios" de "minorias" (e também vai contra o sugerido num recente relatório da OCDE sobre Portugal). Estando actualmente as propinas em €900, elas corresponderão a cerca de um sexto do custo médio anual de um aluno numa universidade pública, sendo o restante pago pelos contribuintes - o que poderia com alguma facilidade ser considerado outro "privilégio" de outra "minoria".
É óbvio que, em termos de análise económica, faz sentido que parte do custo da educação não seja cobrada a quem recebe esse serviço, uma vez que há externalidades positivas associadas à educação - o seu benefício não recai exclusivamente em quem frequenta o ensino superior público (um estudo empírico para Portugal encontra-se aqui). Além disso, o baixo nível de frequência universitária da população portuguesa torna ainda mais legítimo o deslocamento dos custos do estudante para o contribuinte (quanto menos universitários, maior é o benefício social extra de mais licenciados).
Por outro lado, não é claro que os termos actuais de divisão dos custos (um sexto/cinco sextos) seja o mais apropriado em termos de eficiência e equidade. Quanto à equidade, causa sempre desconforto pensar que os impostos de pessoas com a antiga quarta-classe (ainda a maioria dos trabalhadores em Portugal) são utilizados para pagar licenciaturas, sobretudo quando estas últimas abrem em muitos casos as portas a empregos bem remunerados. Além disso, a acreditar na percepção generalizada que as universidade privadas são frequentadas, em média, por estudantes de famílias menos abastadas, é importante ter em conta que as propinas no sector privado são cerca do triplo do valor cobrado no sector público.
Quanto à eficiência do actual nível de subsidiação, o problema coloca-se não só em termos do excesso de "consumo" de educação (que poderá ter como evidencia os níveis elevados de reprovação e não conclusão de licenciaturas), mas também pelas restrições colocadas ao investimento na qualidade do sector público. Por exemplo, em Inglaterra, o custo médio de um curso superior (£10.000) é cerca do triplo do valor em Portugal, o que sugere que há um enorme potencial a cumprir em termos da melhoria da qualidade do ensino superior. Já todos sabemos que "não há almoços grátis" - mas continua-se a querer não pagar a conta ou só comer migalhas.
Uma alternativa ao actual modelo de financiamento que merece ser considerada com atenção são as chamadas "propinas variáveis com o rendimento" ("income-contingent fees"), como os modelos adoptados ou em adopção em vários países, incluindo Inglaterra. Em vez de pagar as propinas enquanto estuda, os estudantes só começam a reembolsar o custo das suas licenciaturas a partir do momento em que estejam empregados e a auferir rendimentos suficientemente elevados. Diferindo o pagamento para a fase do ciclo de vida em que a pessoa está empregada, o Estado pode passar a cobrar mais pelo serviço que presta, sem criar obstáculos ao acesso ao ensino superior associados a propinas elevadas como inclusivé passando a dispor de mais recursos para proporcionar bolsas de estudo. Ao mesmo tempo, com mais recursos, pode finalmente passar a ser possível colocar Portugal no mapa cada vez mais globalizado (com os seus desafios e potencialidades) do ensino superior.
PS-O anúncio do MCES de ontem também sugere que os resultados das diferentes universidades em termos do percurso no mercado de trabalho dos seus ex-alunos vão receber mais atenção e, eventualmente, divulgação pública. É uma iniciativa que, quanto a mim, merece aplauso: quanto mais informação houver sobre um sector infelizmente ainda bastante opaco, melhor. Mas, mais uma vez, informação deste tipo terá que ser interpretada com cuidado: uma vez que os alunos seleccionam-se e são seleccionados para diferentes universidades, as diferenças que se venham a encontrar entre as universidades não irão reflectir unicamente as diferenças de "qualidade" das mesmas.