15.12.14
O Banco de Portugal e a recuperação do emprego
O Banco de Portugal, no seu Boletim Económico divulgado este mês, publicou uma breve análise da evolução recente do emprego no país. As três páginas do estudo debruçam-se sobre vários assuntos, como a evolução do emprego por conta de outrem e por conta própria, as medidas ativas de emprego e os estágios profissionais, o número de funcionários públicos, a evolução previsível do emprego em função do crescimento económico, e as estatísticas do INE, do IISS, do IEFP, e da DGAEP.
De forma significativa, a análise conclui que as estatísticas oficiais
do INE estão a sobre-estimar a recuperação do emprego. A análise tambem sugere que cerca de um terço
desta recuperação se deve às medidas ativas de emprego e que estas novas estimativas
da recuperação do emprego que o BdP já serão consistentes com a evolução
da atividade económica.
Dada a relevância do assunto, deixo aqui alguns comentários:
1. Provavelmente o INE e ou o Eurostat irão pronunciar-se
sobre este tema, na medida em que o BdP indica que as estatísticas do INE, enquadradas
na metodologia do Eurostat, não estão a capturar a verdadeira evolução do
mercado de trabalho. Parece-me um assunto da maior importância, até em termos
das suas implicações junto das estatísticas produzidas por outros países.
2. A explicação técnica da “sobre-estimação” do crescimento
do emprego passa pelo refrescamento das amostras das novas rotações do
Inquérito ao Emprego, baseadas nos Censos de 2011 a partir do 3.o trimestre de
2013. Admitindo que este refrescamento induz um ajustamento “artificial” no
sentido de uma recuperação mais pronunciada do emprego, então será necessário
admitir também uma perspetiva simétrica sobre este assunto, nomeadamente que o
emprego terá caído mais até ao 3.o trimestre de 2013 do que aconteceria com uma
amostra mais atualizada também nesses trimestres. Por outras palavras, o emprego terá tambem caído menos ao longo dos anos anteriores (entre 2011 e 2013, por exemplo) do que o referido pelas estatísticas
oficiais – e não apenas aumentado menos desde 2013.
3. O sucesso das medidas ativas de emprego (e dos estágios
em particular) depende em muito do interesse da parte das empresas em alargar os
seus quadros de pessoal, tanto no curto prazo como num período mais longo, o
que por sua vez está obviamente ligado à sua situação económica. O sucesso destas
medidas depende também do destaque e operacionalização que elas recebem em
termos da política de emprego de cada país – veja-se, por exemplo, a grande
importância e sucesso destas medidas no caso da Dinamarca. Surpreende, assim,
que o BdP desvalorize o emprego relacionado com medidas ativas de emprego, aparentemente assumindo que ele é inteiramente artificial, apesar dos estudos rigorosos que
apontam importantes efeitos de empregabilidade, inclusive no caso português.
4. O BdP argumenta que a “nova” variação do emprego já é
consistente com a variação observada na actividade económica, sugerindo que não
houve mudança estrutural significativa na economia, nomeadamente em termos de
uma maior capacidade de produzir emprego para um dado nível de recuperação
económica. No entanto, na verdade, mesmo os novos valores de crescimento do
emprego indicados pelo BdP continuam a ser mais elevados do que os
previstos, dadas as estimativas sobre esta relação e o ainda baixo crescimento
económico de 2013 e 2014.
Em conclusão, Portugal continua a precisar de análises
rigorosas sobre a sua economia e o BdP será seguramente a entidade nacional melhor
apetrechada para as conduzir. Infelizmente, penso que neste caso, como em outros assuntos no
passado – nas questões do endividamento nacional, do financiamento das empresas ou da flexibilidade dos salários – a
análise do BdP não contribuiu para esclarecer rigorosamente a opinião pública nem para
dotar os decisores públicos da informação mais adequada.