8.11.15

 

Salário mínimo: para além das médias


Para compreender e antecipar com rigor os efeitos do aumento do salário mínimo (SM) - na linha do debate em curso (link, link, link) - importa analisar o mercado de trabalho com a maior profundidade possivel.

Desde ja, importa ter em conta que o efeito de um aumento do SM junto de empresas que não têm praticamente nenhum empregado a auferir o salário mínimo será baixo ou mesmo inexistente. Para uma empresa “média”, o aumento do SM nunca terá efeitos significativos, por exemplo em termos de massa salarial ou lucros.

Da mesma forma, para um trabalhador “médio”, com remuneração superior ao SM, esse aumento também não implicará riscos de desemprego.

O problema coloca-se junto das empresas e dos trabalhadores para quem o SM tem significado, mesmo que estes tenham pouco peso nas médias. Mas é aí (nessas "margens") que importa olhar.

Os gráficos em baixo (baseados nos Quadros de Pessoal referentes a outubro de 2013; versao de 2012 aqui) ilustram as enormes diferenças em termos de incidência do SM (ainda no valor de €485) junto de diferentes empresas e trabalhadores – sublinhando a elevada importância e sensibilidade do SM para conjuntos importantes da economia portuguesa.








Entre outros resultados, verifica-se que:
  1. Mais de 30% dos trabalhadores das empresas com entre 1 e 4 trabalhadores e das empresas com até um ano completo de existência auferem o SM (comparando com menos de 5% para as empresas com mais de 250 trabalhadores)
  2. Mais de 20% de todos os trabalhadores de vários distritos (nomeadamente Braga, Vila Real, Bragança e Castelo Branco) e setores (nomeadamente agricultura, alguma industria, transportes, restauração e alguns serviços - nao especificados nos graficos) recebem o SM
  3. Mais de 60% dos trabalhadores com 18 anos recebe o SM, uma percentagem que reduz-se gradualmente com a idade do trabalhador, até estabilizar nos 10% a partir dos 25 anos
  4. Cerca de 25% dos trabalhadores no seu primeiro ano na empresa recebem o SM (comparando com menos de 10% a partir do décimo ano de antiguidade)
  5. Cerca de 20% dos trabalhadores com até ao 3º ciclo do ensino básico recebe o SM, comparando com apenas 5% dos trabalhadores com estudos pós-secundários.

Por outras palavras, o SM tem grande incidência junto de trabalhadores mais jovens, menos qualificados, nos primeiros anos de trabalho, em setores e regioes específicos e em empresas jovens e de pequena dimensão. São precisamente os grupos economicos mais frageis - mas, por outro lado, tambem os que encerram maior potencial de criação de emprego.

Verifica-se também uma forte redução da incidência do SM com a idade do trabalhador ou da empresa ou com a antiguidade na empresa. Estes resultados sublinham o aspeto dinâmico do SM, como um salário de entrada, que é posteriormente aumentado com o tempo.

Também em termos internacionais importa analisar criticamente as análises em termos médios. Por exemplo, a maioria dos estudos existentes sobre o assunto foram feitos sobre países com desemprego e SMs baixos, como são os casos dos EUA ou do Reino Unido. Daqui resulta que é muito difícil extrapolar desses resultados para países com desemprego e SMs elevados (em termos relativos), como é o caso de Portugal.

Em conclusão, dada a elevada incidência do SM junto de importantes grupos de trabalhadores e de empresas, é difícil não concluir no sentido de haver um risco significativo de efeitos negativos de novos aumentos do SM no curto prazo. A história recente de Portugal aponta nesse sentido: veja-se a travagem na quebra do desemprego no semestre subsequente ao aumento de outubro de 2014.

Para aumentar os salários mais baixos, em vez de se procurar soluções aparentemente faceis como o aumento do SM, importa sim concentrar esforços no aumento da produtividade, a principal determinante dos níveis de vida.

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